segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Introdução à metafísica das propriedades



Apresento nestas páginas o problema filosófico das propriedades. Começo por determinar o problema que está em causa para depois explorar algumas alternativas teóricas que procuram solucioná-lo.






O problema

Para mostrar qual é o problema, podemos, pré-teoricamente, fazer uma distinção entre entidades universais e particulares. Os chamados "universais" são de dois tipos: propriedades e relações. Os particulares são também de dois tipos: concretos e abstratos. As propriedades são os atributos, os aspectos, as características ou as qualidades que os particulares têm ou instanciam. Por exemplo, o particular Sócrates instancia1 as propriedades de ser humano, de ser sábio, entre outras. As relações, por sua vez, são as entidades que resultam da interação entre particulares. Por exemplo, a frase "Sócrates é o mestre de Platão" representa a relação ser mestre de que ocorre entre os particulares Sócrates e Platão.

Parece que todos concordam que há propriedades (e relações), isto é, que os particulares têm características. O problema, a que podemos chamar problema dos universais, é saber se uma mesma propriedade está em diferentes particulares (e no caso das relações, se uma mesma relação está em diferentes particulares), ou seja, se uma mesma propriedade está "espalhada" por vários particulares, ou se, pelo contrário, a propriedade de cada particular é ela mesma particular, não estando presente em qualquer outro particular. Este é o problema acerca da semelhança qualitativa detectada em diversos particulares que são numericamente diferentes. Por exemplo, Sócrates e Platão são dois particulares diferentes, mas possuem as propriedades de serem sábios, humanos e filósofos. As perguntas que se fazem são: As propriedades têm a mesma natureza que as suas instâncias? Isto é, são elas particulares como os particulares que as possuem?
Temos de notar aqui que "problema dos universais" é uma má designação para o problema em causa; isso porque falar em universais já é uma tentativa de responder ao problema — uma tentativa realista. Mas, porque essa é a designação canônica, continuarei a usá-la, ciente do problema terminológico que envolve.

O problema dos universais pode ser dividido em dois, um de caráter linguístico e outro metafísico. O problema linguístico é referente ao fato de dois particulares diferentes receberem a mesma descrição. Por exemplo, ao fazermos uma descrição de Sócrates e Platão designamos ambos com os predicados "sábio" e "humano", entre outros. O problema aqui é explicar como funciona a predicação — a aplicação de predicados a nomes, como em "Sócrates é sábio", ou a aplicação de predicados a termos abstratos singulares, como em "A sabedoria é uma virtude".

Mas o problema que parece ser central na discussão acerca das propriedades é o metafísico. Podemos formulá-lo por meio de duas perguntas, como sugere Keith Campbell (apud, Oliver, 1996, p. 48):
  1. Considerando um objeto vermelho, podemos perguntar: o que tem este objeto em virtude do qual é vermelho?
  2. Considerando dois objetos vermelhos, podemos perguntar: o que têm estes dois objetos em virtude do qual são ambos vermelhos? Será que aquilo que faz vermelho o primeiro objeto é o mesmo que faz vermelho o segundo objeto? Ou são coisas diferentes, mas idênticas qualitativamente, ou em outras palavras, coisas completamente semelhantes a ponto de serem indiscerníveis, que fazem vermelhos os dois objetos?
O problema metafísico, de modo geral, consiste em saber qual é o fundamento das propriedades das coisas. Um aspecto dessa discussão é a questão de saber se as propriedades são particulares ou universais. Aqui o problema não é acerca da aplicação de termos como no problema linguístico, mas sim acerca da própria natureza das coisas.

Este artigo pode ser lido na íntegra aqui.

Citação: Figueiredo, R. A. (2009). "Introdução à metafísica das propriedades". Crítica. Artigo eletrônico publicado em 07/10/2009 e encontrado em <http://criticanarede.com/html/propriedades.html>.