quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Mitologias V




Mitologias V

Acrescentamos abaixo mais um fragmento da obra “Mitologias” de Roland Barthes sobre os mitos de direita:

Estatisticamente, o mito se localiza na direita. É aí que ele é essencial: bem-alimentado, lustroso, expansivo, falador, inventa-se continuamente. Apodera-se de tudo: justiças, morais, estéticas, diplomacias, artes domésticas, Literatura, espetáculos. A sua expansão tem a exata medida da omissão do nome burguês. A burguesia pretende conservar o ser sem o parecer: é, portanto, a própria negatividade do parecer burguês, infinita como toda negatividade, que solicita infinitamente o mito. O oprimido não é coisa alguma; possui apenas uma fala, a de sua emancipação, o opressor é tudo, a sua fala é rica, multiforme, maleável, dispõe de todos os graus possíveis de dignidade: tem a posse exclusiva da metalinguagem. O oprimido faz o mundo e possui apenas uma linguagem ativa, transitiva (política). O opressor conserva o mundo, a sua fala é completa, intransitiva, gestual, teatral: é o Mito; a linguagem do oprimido tem como objetivo a transformação e a linguagem do opressor, a eternização.
Essa plenitude dos mitos da Ordem (é assim que a burguesia se designa a si mesma) comporta diferenças internas? Existem, por exemplo, mitos burgueses e mitos pequeno-burgueses? Não podem existir diferenças fundamentais, pois, qualquer que seja o público que o consome, o mito postula a imobilidade da Natureza. Mas podem existir graus de realização ou expansão: certos mitos amadurecem melhor em certas zonas sociais; também existem microclimas para o mito. (2003. p. 241)

Depois de uma análise dos mitos de esquerda (Mitologias IV), passemos a caracterização dos mitos de direita dado por Barthes. Os mitos de direita são aqueles que querem a manutenção da ordem, querem a permanência dos tempos e, para isso precisam controlar dos os meios de comunicação e enchê-los de mitos. “O oprimido”, dirá Barthes, “faz o mundo e possui apenas uma linguagem ativa, transitiva (política). O opressor conserva o mundo”. Essa é uma diferença fundamental entre esquerda e direita: a revolução e o conservadorismo. Enquanto a esquerda quer transformar o mundo, não só com palavras, mas também com ação; a direita quer a permanência, quer lutar contra qualquer mudança, quer conservar a status quo ou, em outras palavras, quer a manutenção da ordem do mundo tal como ela se apresenta. Para a direita a mudança não é necessária e, por isso, ela necessita ter a posse exclusiva da metalinguagem, isto é, do mito, pois o mito auxilia na eternização das coisas tais como elas não se encontram no mundo real. Por isso, é uma deturpação da Natureza, uma pseudophýsis. O mundo é mudança e transformação, já diria Heráclito.

Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes