A Polícia Federal em Roraima, em
conjunto com a Receita Federal, deflagrou a Operação Anel de Giges, na manhã do
dia 28 de setembro de 2017, com o objetivo de investigar a organização
criminosa acusada de peculato, lavagem de dinheiro e desvios de verbas
públicas. Dois filhos e dois enteados do senador Romero Jucá (PMDB-RR) são alvos
da operação. O que nos chama atenção aqui, e que será alvo da nossa coluna de
hoje, é o nome dado a operação da PF: Anel
de Giges. Por que utilizaram esse nome? Quem seria Giges e que poder teria
o tal anel?
Giges (ou Gyges) é um nome conhecido
da antiga Lídia, região da Ásia Menor, onde hoje se situa a Turquia. Além dele
ser o principal personagem da linhagem dos Mermnadae. Sardis foi a principal cidade da Lídia e teve
seu apogeu político, cultural e econômico na era da dinastia Mermnadae entre os
séculos VII e VI a.C. Os Mermnadae iniciaram seu governo com a subida de Giges
ao poder e terminaram com a queda de Creso pela invasão persa. Diversas
histórias a seu respeito foram contadas, sendo a mais famosa aquela que conta a
maneira como ele chegou ao poder, tornando-se o primeiro a ser chamado de
tirano. A mais famosa destas histórias é a narrativa posta por Platão no Livro
II (359d-360b) de sua obra “A República”, que tem como principal discussão a
justiça.
Giges era
um pastor que servia na casa do que era então soberano da Lídia. Devido a uma
grande tempestade e tremor de terra, rasgou-se o solo e abriu-se uma fenda no
local onde ele apascentava o rebanho. Admirado ao ver tal coisa, desceu por lá
e contemplou, entre outras maravilhas que contam no mito, um cavalo de bronze,
oco, com umas aberturas, espreitando através das quais viu lá dentro um
cadáver, visivelmente maior do que um homem, e que não tinha mais nada senão um
anel de ouro na mão. Arrancou-lho e subiu. Como os pastores se tivessem
reunido, da maneira habitual, a fim de comunicarem ao rei, todos os meses, o
que dizia respeito aos rebanhos, foi lá também, com o seu anel. Estando ele,
pois, sentado no meio dos outros, deu por acaso uma volta ao engaste do anel
para dentro da palma da mão e tornou-se invisível para os que estavam ao lado,
os quais dialogavam sobre ele como se tivesse ido embora. Admirado, passou de
novo a mão pelo anel e virou para fora o engaste e, ao virá-lo, se tornou
visível. Tendo observado estes fatos, experimentou, a ver se o anel tinha
aquela capacidade, e verificou que, se tivesse seu engaste virado para dentro,
se tornava invisível; se o voltasse para fora, ficava visível. Consciente
disto, logo fez com que fosse um dos mensageiros do rei. Uma vez lá chegado,
seduziu a mulher dele e, com o auxílio dela, atacou e matou o soberano, e assim
tomou o poder na Lídia.
O anel de Giges é, portanto, um anel
de poder capaz de testar a capacidade dos homens de se manterem justos se
tivessem esse poder ou, melhor dizendo, se não estiverem sendo vistos por
outras pessoas. O desafio que se faz, com a narrativa do anel da
invisibilidade, é que homem se manteria justo mesmo invisível? A justiça é
natural ao homem ou é apenas uma obrigação legal que os homens deixam de
cumprir quando não estão sendo observados pelos outros homens?
Contextualizando a história com a
operação da PF, podemos verificar o grave problema que se atinge sobre os
governantes de nosso país que, tentados pelo poder, acabam por fazerem atos
ilícitos e injustos contra os cidadãos, prejudicando, com isso, toda a
população.
* Esse ensaio foi publicado primeiramente na "Gazeta" do Amapá no dia 15/10/17.
* Esse ensaio foi publicado primeiramente na "Gazeta" do Amapá no dia 15/10/17.