sexta-feira, 1 de julho de 2011

Resenha de Lange, Marc (2009). "Introduction" & "Chapter 1". In: Laws and Lawmakers: Science, Metaphysics, and the Laws of Nature. New York: Oxford University Press.

Introdução


Os objetivos de Lange neste livro são (I) responder como as leis diferem de fatos que não são leis, explicando o status de o que é ser uma lei (lawhood), e (II) responder como as diferenças entre leis e acidentes deve ser explicada por meio da indicação de fazedores de leis (lawmakers). Ele responde dizendo  que as leis naturais diferem dos acidentes, pois têm uma relação íntima com fatos que ocorreriam dada certa circunstância que poderia não ocorrer (fatos subjuntivos). Lange também pretende mostrar como esses fatos subjuntivos são os fazedores de lei das leis, e indicar uma característica essencial das leis, a saber, a persistência sob quaisquer condições contrafactuais logicamente consistentes com as leis, o que as faz diferir dos acidentes.

No primeiro capítulo, Lange tenta nos mostrar que as leis formam conjuntos contrafactualmente estáveis, ou seja, que eles possuem um tipo especial de invariância sob condições contrafactuais. Ele quer também nos mostrar que com sua abordagem somos aptos a apreender a estrutura hierárquica das leis.


No segundo capítulo, ele tenta nos explicar a natureza da necessidade das leis naturais - contingência lógica e inevitabilidade - e nos indicar o que as faz necessárias (na medida em que são menos necessária que a necessidade lógica ampla) em termos de fatos subjuntivos. Diz-nos Lange que sua abordagem tem a capacidade de explicar todas as necessidades como espécies do mesmo gênero, as posicionando em ranking por meio do conceito de estabilidade, e de indicar por que de elas deverem ser rankeadas de acordo com sua força. O que difere substantivamente das abordagens de lei natural de Brian Ellis e David Lewis. Necessitaristas, como Ellis, tomam as leis como tão necessárias quanto a necessidade lógica, enquanto regulatistas, como Lewis, tomam as leis como contingentes e asserem que não há uma fronteira metafísica entre regularidades acidentais e regularidades que supostamente são leis.


Assim, no terceiro capítulo, Lange nos expõe o que ele considera ser as vantagens de sua abordagem. Estas são: (1) ela consegue explicar o que seria uma lei mudar e a razão pela qual leis são imutáveis, (2) ela consegue dar conta de metaleis da física (como os princípios de simetria), usando o conceito de estabilidade para explicar a relação das metaleis com as leis que elas regulam de maneira semelhante à relação entre as leis e os fatos que elas regulam, e (3) ela consegue mostrar como a relação entre leis e chances objetivas fica de fora da abordagem.


Finalmente, no capítulo 4, ele nos apresenta sua tese e seus argumentos. Sua tese é de que as leis são leis, e não acidentes, porque são necessárias, e que o que as faz necessárias são os fatos subjuntivos. Ou seja, os fatos subjuntivos seriam os fazedores de lei das leis. E, assim, tais fatos seriam ontologicamente primitivos e responsáveis pela necessidade das leis. O que é uma visão divergente da convencional, dado que esta última  toma as leis como fundamentando os contrafactuais. Suas razões pela tese são: (1) que a relação das leis com as contrafactuais tem uma explicação muito mais direta se os fatos subjuntivos forem os fazedores de lei do que se esses fazedores de lei fossem essências, universais, etc.; (2) que se as leis forem necessárias em virtude de fatos subjuntivos, poderemos dar conta do regresso da necessidade (este regresso seria o seguinte: as leis são necessárias em virtude de P, mas P é necessário? Se não, as leis são contingentes; se sim, então P é necessário em virtude de algo, por exemplo, Q. Mas é Q necessário? Se não, as leis são contingentes; se sim, o mesmo raciocínio se aplica), diz-nos Lange, já que ele diz que as leis seriam necessárias em virtude de fatos subjuntivos, que são necessários em virtude de outros fatos subjuntivos, e assim por diante); e (3) que a causalidade dos estados instantâneos é melhor explicada em termos de fatos subjuntivos irredutíveis (por exemplo, a velocidade instantânea de um corpo seria que se o corpo continuasse sua trajetória, ele teria uma derivada temporal de Vcm/s).


Capítulo 1 - As leis formam conjuntos contrafactualmente estáveis


Lange pensa que sua abordagem pode nos responder o que faz um fato ser uma lei e ainda preservar as funções que costumamos atribuir às leis. Essas funções seriam: prover explicações de regularidades e de ocorrências, e fazer predições contrafactuais e predições do futuro. As leis teriam uma propriedade especial, que é sua permanência em situações possíveis não actuais, já que as utilizamos, entre outras coisas, para predizer o comportamento de vários cenários possíveis.


Assim, para nos explicar o que faz um fato ser uma lei, Lange começa tentando traçar uma distinção entre acidentes, leis naturais e verdades lógicas. Ele nos diz que oa acidentes são verdades que não se seguem das leis naturais e das verdades lógicas, e que eles podem falhar em ser o caso sem violar nenhuma lei natural. Os acidentes têm causas, mas essas causas são elas mesmas acidentais. E, dessa forma, como acidentes poderiam não ser o caso, eles não podem explicar o motivo pelo qual regularidades acidentais são regularidades. Por sua vez, as leis naturais possuem uma necessidade que os acidentes não têm: as coisas têm de se conformar às leis da natureza (ex: o sal tem de se dissolver em água). E é essa necessidade que as dá o seu poder explicativo. No entanto, como as leis naturais poderiam não ser o caso em algumas ficções, a necessidades das leis naturais têm um caráter distinto da necessidade das verdades lógicas, que não poderiam não ser o caso nem nas ficções.


Como dissemos na resenha da introdução, nem todos os pensadores concordariam com esse caráter intermediário e anômalo das leis (logicamente contingentes e, de alguma forma, necessárias). Brian Ellis argumenta a favor de que as leis são tão necessárias quanto as verdades lógicas, enquanto David Lewis argumenta a favor de que não há distinção metafísica entre leis e acidentes. Lange não pretende prover argumentos definitivos contra Lewis ou Ellis, mas pretende apenas desenvolver sua própria abordagem, mostrando suas vantagens. E, nesse sentido, ele tem de desenvolver uma abordagem de o que consiste a necessidade das leis naturais, diferindo-as dos acidentes e das verdades lógicas. E ele tenta fazer isso mostrando como as leis naturais diferem dos acidentes pela necessidade que têm e como elas diferem das verdades lógicas pela necessidade que lhes falta - tomando, é claro, todas as necessidades como fazendo parte do mesmo tipo (espécies do mesmo gênero).


Para explicarmos como Lange faz isso, devemos, como ele, começar dando um exemplo de um contrafactual e indicando sua formalização:


p→q (Se p tivesse sido o caso, q teria sido o caso)


Os contrafactuais nos mostram, segundo Lange, que as leis se manteriam mesmo que as coisas fossem diferentes, ou seja, que as leis governam o actual e o possível. E eles também têm algumas características interessantes, a saber: (A) Diferentemente de outras condicionais, p→q e q→r não implicam p→r. Um exemplo: é verdade que se Sócrates tivesse sido mulher, não seria filósofo; é verdade que se Sócrates não tivesse sido filósofo, ainda seria um homem; mas é falso que se Sócrates tivesse sido uma mulher, ainda assim seria um homem. (B) É misterioso o que faz um contrafactual, tal como p→q, verdadeiro; enquanto não é nem um pouco misterioso ver o que faria verdadeiro "todos os cubos de ouro tem menos de uma milha cúbica". Um exemplo: se Júlio César estivesse no comando na Guerra da Coréa, ele teria utilizado a bomba atômica - embora pensemos que seja algo do mundo que faz essa contrafactual verdadeira, como a personalidade de Júlio César, é difícil estabelecer tal coisa. E há também os problemas explorados por Goodmand (1947/1983)  e Lewis (1973/1986b) de que a verdade de contrafactuais depende de restrições ceteris paribus e de que as condições ceteris paribus exigem ainda outras restrições contrafactuais, o que nos leva ao problema da possibilidade da redução de verdades contrafactuais a fatos não contrafactuais (e leis naturais). Um exemplo: "se o fósforo tivesse sido riscado, ele teria acendido" precisa ser restrito por condições como não haver muita umidade no local, haver fósforo na caixa, haver oxigênio no local, entre outras coisas, além de também exigir a verdade de contrafactuais como "se o fósforo tivesse sido riscado, ele ainda estaria seco, oxigenado etc". (C) Os contrafactuais têm uma sensibilidade a contextos que é suspeita. Um exemplo: enquanto em alguns contextos é verdade que se Júlio César estivesse no comando na Guerra da Coréa, ele teria utilizado a bomba atômica, em outros contextos é verdade que se Júlio César estivesse no comando na Guerra da Coréa, ele teria utilizado uma catapulta.


Todavia, os contrafactuais seguem princípios lógicos, ainda que estes sejam incomuns. Um exemplo seria: ((p→q) & ((p&q)→r) implica logicamente que p→r. E são as nossas observações que confirmam tanto os contrafactuais, quanto nossas predições sobre o mundo actual. O exemplo de Lange é: nossas observações passadas de esmeraldas confirmam tanto que todas as esmeraldas são verdes, quanto que se houvesse uma esmeralda em meu bolso, ela seria verde. Lembro apenas que o autor conhece e leva em conta a distinção entre confirmação e fazer verdade (truth making). E que ele toma os problemas indexicais como coisas geradas pela diferença de proposições que uma mesma frase pode comportar.


Mas qual a relação das leis e acidentes com os contrafactuais? Ou melhor: como as leis diferem dos acidentes com relação aos contrafactuais? Lange pretende nos mostrar que os acidentes têm um alcance de invariância menor (narrower) do que as leis, dado que se uma regularidade acidental não tivesse ocorrido, as leis ainda se manteriam, enquanto algumas outras regularidades não se manteriam:


  • Para qualquer lei e para qualquer acidente, o alcance das suposições contrafactuais sob o qual a lei é preservada contém totalmente e vai, de algum modo, além do alcance das suposições contrafactuais sob o qual os acidentes são preservados. (p. 12)


Mas essa asserção não é totalmente incontroversa, pois podemos ter situações com os mesmos acidentes e leis diferentes. O próprio autor pensa que não é o suficiente falarmos de alcance de suposição contrafactual e começa a falar sobre preservação nômica a fim de ver se esta pode exercer a função do domínio de suposição contrafactual.


  • Preservação Nômica (PN): m é uma lei sse m se mantivesse em qualquer suposição contrafactual (ou subjuntiva) p que é logicamente consistente com todas as leis (tomadas em conjunto). (p. 13)


E ele faz alguns refinamentos em PN, a fim de que ela dê conta da sensibilidade contextual dos contrafactuais:


  1. Um contrafactual com antecedente irrelevante para o contexto talvez não seja nem verdadeira e nem falsa no contexto.
  2. Pode ser que num certo contexto "p→m" seja verdade para toda p relevante e, mesmo assim, m não ser uma lei.


Para fazer PN dar conta dessas possibilidades, Lange a reformula assim:


  • PN: m é uma lei sse para qualquer contexto conversacional e para qualquer p que seja relevante no contexto como uma antecedente de um contrafactual e que seja consistente logicamente com todas as leis (tomadas em conjunto), a proposição expressa naquele contexto por "p→m" é verdadeira (p. 15) [observar a nota 16 do livro para uma definição de lei científica]


Mas PN, tal como foi reformulado, têm um problema sério, a saber, ela não dá conta de distinguir as leis naturais das verdades lógicas. E ela não dá conta, pois para distinguir leis de acidentes, ela tem de tomar as verdades lógicas e suas consequências como leis, pois as verdades lógicas são preservadas em quaisquer situações contrafactuais em que as leis naturais são preservadas, e que as consequências lógicas das leis são preservadas em todas as situações em que as leis que as implicam são preservadas. Como as verdades lógicas têm uma invariância maior que as leis naturais, Lange não vê problemas em tomar "lei natural" como um termo para uma conjunção das leis naturais, das verdades lógicas amplas e de suas consequências lógicas. No entanto, o problema persiste: como distinguir as verdades lógicas das leis naturais que não são verdades lógicas?


Lange propõe que as leis lógicas têm uma maior invariância em suposições contrafactuais, e passa a falar sobre a antecedente da contrafactual, p, a fim de refinar melhor a PN. De tal antecedente é exigido que ela seja consistente com todas as leis tomadas em conjunto, ou seja, "deve haver um mundo logicamente possível em que p e em que todas as leis se mantém" (p. 16).


Mas o que seria uma lei se manter? Lange distingue duas posições possíveis, a saber: (i) uma lei se mantém em um mundo sse essa lei é verdadeira nesse mundo, e (ii) uma lei se mantém em um mundo sse essa lei existe nesse mundo. Um problema inicial que pode mostrar essa diferença é o seguinte. Primeiramente, considere que "p" é equivalente a "não é uma lei que a energia é conservada". p é compatível com ser verdadeiro - apenas como um acidente (as a matter of acidental fact) - que a energia é conservada, embora não seja compatível com ser uma lei que a energia é conservada.

  • Assim, PN é falso, se demanda que toda lei seja verdadeira sob qualquer suposição contrafactual consistente com a verdade (embora talvez não com a leidade (lawhood)) de todas as leis. (p. 17)

A maneira utilizada pelo autor para solucionar esse problema é restringir PN a ter "p" apenas como subnômica. Proposições subnômicas são aquelas que não contém termos como "é uma lei que" e "não é uma lei que" e que não contém termos modais (aléticos, deônticos etc). Elas são verdadeiras em virtude dos fatos subnômicos. Os fatos subnômicos, que as proposições subnômicas expressam, são os fatos que são governados pelas leis. E tais fatos podem ser pensados como o nível inferior da hierarquia dos fatos, leis, metaleis etc. Dessa forma, para Lange, PN devidamente restrita seria (e é esta formulação que ele utilizará sob a sigla PN (em inglês, NP) no resto do livro:

  • PN: m é uma lei sse em qualquer contexto p→m se mantém para qualquer p que é logicamente consistente com todos os n's (tomados em conjunto), onde é uma lei que n (ou seja, para qualquer p que é logicamente consistente com as leis de primeira ordem). (p. 20)

O problema que Lange se coloca, então, é o seguinte: aceitamos que "p→m" nos diz que a verdade de m é preservada sob a situação contrafactual p, de modo que se p tivesse sido o caso, m teria se mantido verdadeiro. Mas e se ~m fosse também verdadeiro sob a situação contrafactual p? Para evitar que tais contextos conversacionais, onde m e ~m são o caso sob p, influenciem em algo ser uma lei ou em uma lei ser preservada, devemos também restringir PN a não aceitar m como sendo uma lei se p→~m for o caso. Pois se não fizermos isso, teríamos de aceitar de modo barato que m é uma lei quando p→m e p→~m. Assim, uma restrição de PN que daria conta de distinguir as leis que são preservadas sob p, mas sem ser de uma maneira barata, seria:

  • m é uma lei sse em qualquer contexto, p→m e ~(p→~m) se mantém para qualquer p que é logicamente consistente com todos os n's (tomados em conjunto), onde é uma lei que n. (p. 21)

Isso poderia ser reformulado de maneira breve pelo condicional poderia (→, the might conditional), que se relaciona com o condicional teria sido (→, the would conditional). As relações entre "→" e "→" são: (I) ~(p→~m) implica logicamente (p→m), e (II) ~(p→~m) implica logicamente ~(p→~m). Assim, "em virtude desses dois condicionais poderia, ambos (p→m) e ~(p→~m) no princípio acima intencionado se seguem de ~(p→~m)" (p. 21). Dessa forma, a reformulação, que é, segundo Lange, uma boa maneira de capturar a preservação não barata das leis, seria:

  • m é uma lei sse em qualquer contexto, ~(p→~m) se mantém para qualquer p que é logicamente consistente com todos os n's (tomados em conjunto), onde é uma lei que n. (p. 21)

Isso é assim, pois se as leis não requerem que m, dado qualquer p, então m poderia não ser o caso. O que nos faz pensar que se as leis requisessem que m, dado qualquer p, a razão pela qual m seria o caso (ou se manteria) seria que é uma lei que m. E a razão pela qual m ser uma lei explica m ser o caso é que a lei m torna m inevitável (necessário). E, assim, o que explicaria m ser o caso no mundo possível não actual mais próximo ao nosso seria m ser uma lei lá. Um exemplo seria o mundo onde, diferentemente do mundo actual, John perdeu o ônibus. Lá as leis (tal como a lei de conservação de energia) não seriam diferentes, ainda que John tenha perdido o ônibus. Disso podemos derivar o princípio:

  • m é uma lei sse em qualquer contexto "se p tivesse sido o caso, m seria uma lei" se mantém para qualquer p que é logicamente consistente com todos os n's (tomados em conjunto), onde é uma lei que n. (p. 22)

Dessa forma, juntando o princípio acima de que (p→(m é uma lei)) com PN, temos que "m é uma lei" implica que q→m, dado q seguir as mesmas condições de p. E isso nos leva a pensar que se m é uma lei, então (p→(q→m)). Teríamos, então, que ter um princípio para capturar m como uma lei, mesmo no caso de contrafactuais entranhados (nested counterfactuals). E o autor nos provê tal princípio:

  • m é uma lei sse em qualquer contexto p→m se mantém, p→(q→m) se mantém, e assim por diante, desde que p seja consistente com todos os n's (tomados em conjunto), onde é uma lei que n, e q seja da mesma forma, e assim por diante. (p. 23)

Mas para preservarmos as leis de modo não barato, precisamos além de p→m, também de ~(p→~m). Da mesma forma, para darmos conta de contrafactuais como q→(p→m), precisaremos requerer que ~(q→~(p→m)). E, do mesmo modo como ~(p~m) implica p→m e implica ~(p→~m), ~(q→(p~m)) implica tanto (q→~(p→m)), quanto q→(p→m). E isso nos levaria ao seguinte princípio de preservação:

  • m é uma lei sse em qualquer contexto (p.  24): 
  1. ~(p~m), 
  2. ~(q→(p→~m)), 
  3. ~(r→(q→(p→~m))), ...
  4. E p, q, r... são cada um logicamente consistentes com todos os n's (tomados em conjunto) e onde é uma lei que n.

Daí, o autor passa, então, a tratar de alguns problemas sérios de PN, a saber, a trivialidade, a circularidade a arbitrariedade. Lange acredita que PN junto com os princípios indicados é consistente com a prática científica de criar condições básicas/iniciais e de as torcer hipoteticamente de qualquer maneira que seja consistente com as leis. Mas pensa que existe, pelo menos prima facie, um problema, a saber, que mesmo que PN (devidamente restrito) seja verdadeiro, ele não nos mostra como distinguir as leis dos acidentes mediante suas relações com os contrafactuais (p. 26), dados os problemas a seguir. O problema da trivialidade advém do fato de que é óbvio que um acidente m não seria verdadeiro em qualquer p consistente com as leis de primeira ordem, dado que se m é um acidente, então ~m é, tanto quanto m, consistente com as leis; enquanto que se m é uma lei, então ~m não é consistente com ela. Por sua vez, o problema da circularidade surge porque pensamos que PN usa as leis para encontrar o raio (range) de suposição contrafactual que é usado para encontrar as leis. E o da arbitrariedade surge, pois nos parece que PN não pode explicar por que a invariância sob situações contrafactuais consistentes com as leis é mais importante para que algo seja uma lei do que outros tipos de invariâncias (tal como algo ser invariável com o fato de que Dilma é presidente do Brasil). Algumas observações sobre e alguns outros filósofos que lidaram com esses problemas podem ser encontrados nas notas 29 e 30 do livro. 

E para evitar tais problemas, Lange passa a falar de estabilidade subnômica:


  • Considere um conjunto não vazio Γ de verdades subnômicas contendo todas as consequências subnômicas de seus membros. Γ possui estabilidade subnômica se e somente se para cada membro m de Γ (e em qualquer contexto conversacional): ~(p~m), ~(q→(p→~m)), ~(r→(q→(p→~m)))..., e para qualquer asserção subnômica p, q, r..., onde ΓU{p} é logicamente consistente, ΓU{q} é logicamente consistente, ΓU{r} é logicamente consistente ... (p. 29)

O autor pensa que o conjunto das leis de primeira ordem (o que ele chama de conjunto lambda: Λ) é subnomicamente estável e que não há nenhum conjunto subnomicamente estável que contém um acidente, a não ser o conjunto de todas as verdades. Assim, sua tese é de que "as leis diferem dos acidentes por pertencerem a um conjunto subnomicamente estável que não contém todas as verdades subnômicas" (p. 30),  ou seja, que nenhum conjunto não maximal que contém acidentes possui estabilidade subnômica (p. 32).

Ainda pode parececr problemático, como ressalta Lange, apelarmos à verdade e falsidade de vários contrafactuais ao asserirmos como as leis diferem dos acidentes em sua relação com os contrafactuais. A resposta do filósofo para isso é nos dizer que o que ele quer é entender a relação entre contrafactuais e leis, e não descobrir quais são as reais leis e os reais contrafactuais. No entanto, ele admite que seria problemático pensarmos que as leis fazem verdadeiros certos contrafactuais e ao mesmo tempo tomar esses contrafactuais como fazedores de lei de certos fatos (fazer um fato se qualificar como uma lei). E nos diz que travará essa discussão nos capítulos 2 e 4.

[a ser continuado...]