terça-feira, 28 de agosto de 2018

O Homem que improvisava




O Homem que improvisava

Muitas vezes tomamos o improvisador como um artista ou um instrumentista, talvez ainda um político. Todos esses têm a característica de se utilizarem da improvisação dentro de seus campos de atuação, o que parece algo inerente a essas funções. Mas há o homem-improvisador que não corresponde a nenhuma dessas categorias. A arte de improvisar na vida vem das adversidades que esta nos apresenta. Improvisar é viver sem ter que planejar o dia de amanhã, é ter que sentir cada instante como único, como um andarilho vagando pelo mundo.

O homem-improvisador é aquele que reflete e age de acordo com o momento vivido, sem que o seu atuar pelo mundo esteja determinado, planejado ou anteriormente pensando. Se tomarmos a famosa frase de Descartes ego cogito, ergo sum, podemos dizer que o homem-improvisador está no “ergo”, nesse logo que precede a existência. O ergo é a existência desprovida do ego e do cogito, é o logo sem o lógos, é tomar a existência como única e intransferível.
Para um existencialista esse é o principal ponto a ser tomado: não há uma essência que preceda a existência, não há um cogito ordenador do que sou, não há ideias inatas pré-concebidas. Tudo é o acaso da existência, tudo faz parte de uma grande improvisação que chamamos vida. Não me refiro a vida como o despertar do ser, mas a vida vivida, a vida agora, ou seja, é o experimentar da vida que nos é único e que permite a multiplicidade existente no mundo. As diversas possibilidades que nos aparecem nos caminhos são todas fruto do ergo e não do ego. Pois o ego quer tomar tudo para si, quer fazer do mundo e da vida um espelho de si mesmo. Mas o ergo é aquele que, desprovido do ego, permite a abertura do caminho e das múltiplas possibilidades da existência.
O ergo também possibilita o encontro com o outro, com o desconhecido, com aquilo que ainda não sabemos o que é. O outro é aquele que nos defrontamos em nossa vida, a novidade que se faz presente e cria possibilidades perante nossas escolhas, tudo isso precedido pelo ergo que faz a relação com conosco e possibilita o múltiplo existir.