Prometeu Julgado
Para análise de hoje, gostaríamos de falar de um autor muito pouco conhecido no Brasil: Karel Čapek, pensador tcheco nascido em 1890 na Boêmia, que na época fazia parte do Império Austro-Húngaro. Čapek deve a sua fama, principalmente, à obra R.U.R. (Rossum Universal Robots), de 1920, peça futurista a qual pretendemos falar em um outro momento. Hoje iremos comentar um pequeno conto sobre o julgamento de Prometeu pelos deuses intitulado “O castigo de Prometeu” e incorporado à obra “Histórias Apócrifas”. Esse livro é uma coleta de contos de Čapek, que no Brasil foi traduzido por Aleksandar Jovanovic e publicado pela Editora 34.
No conto, os deuses estão reunidos para julgar o roubo do fogo divino que
foi entregue aos humanos. O conto joga com o humor para supor como seria o
julgamento que condenou Prometeu às correntes no Cáucaso. Em resumo, Prometeu
será castigado por ter popularizado o fogo e todas as invenções que vieram a
partir do fogo. Vejamos o final do conto:
“Vejam só: até que esse tal fogo serve para alguma coisa, hein? Tivemos
que condená-lo em defesa do interesse público, entende? Aonde iríamos parar se
qualquer um pudesse sair por aí, impunemente, com invenções novas e
retumbantes? Percebe o que quero dizer? Hmm, ainda está faltando alguma coisa
nesta carne. Ah, sim! Descobri! – exclamou extasiado. – O carneiro assado
precisa ser salgado e esfregado com alho! Essa é a maneira correta de
prepará-lo! Aí está uma descoberta de verdade! Veja você que um sujeito como
Prometeu jamais teria pensado nisso!”.
Čapek faz com seu conto uma crítica à elitização e concentração dos meios de produção, não permitindo que a maioria das pessoas tenha acesso aos próprios meios e possam exercer seus ofícios por conta própria. Prometeu é culpado de ter entregado o fogo aos humanos indiscriminadamente, sem selecionar os indivíduos, mas permitindo que todos tivessem acesso ao fogo divino. Dessa forma, a condenação de Prometeu neste conto perde o propósito do roubo para colocar o foco na distribuição. O castigo se dá porque o Titã permitiu que a entrega do fogo fosse para todos, ao invés de selecionar aqueles que poderiam ter o fogo. O roubo em si do fogo diz muito pouco para o motivo da condenação, o risco maior está na publicização e na democratização do fogo como um meio de produção elementar para se poder desenvolver as ciências e as artes.
Luiz Maurício Bentim Menezes